sexta-feira, 10 de junho de 2011

Na sutileza dos relacionamentos humanos


A vida imortal se nos apresenta como a trajetória do Ser em busca de sua real identidade. Assim caminha ele dos primórdios da consciência coletiva aos intermediários da consciência individual para fundi-la, depois, num processo ainda inatingível por nós, não apenas pela beleza de sua essência mas pela exigência de sua magnanimidade. (...)

Assim, entendemos que na trajetória do Ser, nos períodos em que a roupagem carnal o convida à comprovação para si próprio, das aquisições que julga ter, ou que os transbordamentos do Amor Divino o convidam, embalando-o na renúncia a descer para que outros subam, a criatura se defronta com algumas situações que tivemos a ousadia de analisar.

Iniciamos, então, com a Psicologia, por serem os pensamentos do Ser o seu reflexo e, portanto, fundamental que se conheça as suas gravações passadas, as atuais e como interagem nos estados conhecidos como consciência e subconsciência. (...) E nessa mescla de comportamentos individuais surgem o comportamento das multidões, as trocas de idéias, interesses, as aquisições coletivas, os desregramentos que, como desequilíbrio do prumo, conduzem, pelo choque de intenções, às neuroses.

E o Ser descansa seu interior na agitação do desconhecido; e o Ser procura a Paz na desarmonia. E em meio a toda essa precipitação, nos diferentes períodos psíquicos é que a criatura vai percebendo as mesmas incógnitas, de ângulos diferentes; nesses estágios sucessivos é que o Ser vai tendo o desenvolvimento das potencialidades psíquicas.

Quis o Criador, na explosão do seu Amor, que fôssemos individualidades unidas pelas relações. Assim, a validade das relações entre os seres é exatamente a de compormos o todo, ainda sem o percebermos. E nessa relação Ser a Ser, seres e seres, é que as criaturas crescem, se expandem, se entrelaçam, se amam e se solidificam.

Mas nem todas as atitudes dos seres que se desviaram do equilíbrio os conduziram a relacionamentos harmoniosos. Então, quis o Pai que na figura do amigo estivesse representada parte da sua própria; quis o Pai que fosse o amigo aquela parte do Ser que já se permite fundir à outra porque conquistou o privilégio dessa interação. Ele é a força que não deixa o ser desistir, mas o envolve no otimismo e na certeza da vitória.

E tanto entre amigos como entre aqueles que ainda não o são é fundamental que se cuide das palavras, expressão sincera ou não do que o Ser já reflete. A palavra que fere leva à ação que destrói, pois vem do pensamento de angústia; mas o pensamento que eleva conduz o Ser à palavra que alenta e à ação que enobrece.

E entre os serem que devem conviver juntos, como a própria palavra diz, com viver significa, implicitamente, se respeitar, quando ainda não podemos amar, pois cremos que devemos ao menos respeitar a Criação Divina como gratidão ao Pai, e os seres sejam, talvez sua obra mais bela.

Mas, muitas vezes, a chama do egoísmo leva as criaturas ao desrespeito de si própria quando se entrega à maledicência, à maldade, à estagnação. Por isso se faz necessário alertar o Ser para esses parâmetros de desconhecimento das verdades. É dever dos seres a cooperação, e foi nesse sentido que buscamos algumas palavras sobre o assunto.

Mas, como já dissemos, as criaturas, as criaturas se constroem em agrupamentos que constituem as sociedades, e a união delas, as civilizações. Estas representam somatórios de aquisições, oportunidades de aprendizado comum e elaboração mais aprimorada de um determinado parâmetro evolutivo ainda por terminar. É nas diferentes civilizações que o Ser vai adquirindo e firmando conceitos e idéias que agora encouraça, definitivamente, em seu Ser.

Mas, apesar de todas as aquisições fundamentais para a sobrevivência e progresso do Ser, é na sutileza dos relacionamentos humanos que o progresso se dá de forma real e eficiente, pois é nas relações entre as criaturas que as divindades se encontram, na essência de cada um. É na fusão dos corpos e das almas que está o significado maior da Vida: o crescimento do Amor, o progresso em direção ao Amor. Viemos de um todo, estamos contidos nele, ao mesmo tempo que o contemos em cada um de nós.

Mas para que esta caminhada se revista do esplendor que merece, se faz necessário aliar o saber à sabedoria. A sabedoria é o saber já sedimentado, vivido e, portanto, adquirido.

E pelo saber, que leva à sabedoria, a criatura vai buscando a libertação de sua ignorância sobre a Vida. Confunde, a princípio, a liberdade de voar com a libertação de criar as próprias asas; confunde a licença de executar seus desejos mais infantis com a capacidade de superpô-los aos desejos universais. Por isso, a necessidade de se pensar sobre esses dois vocábulos, semelhantes em sonoridade, mas profundamente diversos em conquistas...

E o Ser, em sua caminhada, busca a Verdade, que a princípio não conhece, mas busca. Não percebe o Ser que a beleza e a justiça são aspectos da Verdade nas diferentes dimensões e na relatividade do que concebemos e vivenciamos. Não cogita que eles são um reflexo e um dos aspectos da Harmonia Universal.

Mas nessa conquista de valores espirituais o Ser, encarcerado sucessivamente nos liames da matéria, tem a oportunidade de manipulá-la inconscientemente para que leve à decomposição de tragédias morais, seus desconhecimentos, seus desequilíbrios. E para que esse processo seja suportável pelo Ser e viável para o espírito, quis o Pai que entre os Homens surgissem os que cuidam desse depósito celestial dos males da alma; e fez da Medicina o sacerdócio, a estação sublime da máquina evolutiva. Ela é Religião porque o Ser se religa na dor, é Ciência pela experimentação e é a Filosofia da Vida transposta em fatos. Através da dor se altera a ciência de viver e a filosofia de existir.

E em todos os paradoxos de alegria, dor, tristeza e felicidade, vai o Ser (frágil na contextura humana, porém abrigando em si a fortaleza Divina), em estágios sucessivos que são eternos “renascer”a que chama “vida e morte”, transpondo os obstáculos de si mesmo, vencendo a dor de não ser e a angústia do querer.

São nesses intervalos de matéria e espírito que o Ser, pelas polaridades a que se submete, irá conhecer a polaridade que o originou!

Quisemos, apenas, com nossas idéias, trazer um pouco da nossa Vida à de todos os que conosco conviverem através da leitura; quisemos que nesses momentos, então, fundíssemos nosso saber, nossos anseios e sobretudo nosso Amor.

Permitam-me, pelo que expusemos e pelo significado da palavra, nos declaramos, o amigo Albert Camus.

(Transcrição parcial do Capítulo Palavras Finais, constante do livro Pensamentos sobre o Ser, de Albert Camus, psicografia de Nora T. M. N. Sakamoto, páginas 165 a 171, 1ª edição, de dezembro de 1995).

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