Em mais um vídeo que circula no Youtube o pastor e peputado federal Marco Feliciano insinua queCaetano Veloso e Mãe Menininha do Gantois tem ligação com o diabo durante um culto em sua igreja. É a nova forma de pregar o Evangelho… Enfim, a resposta é do próprio Caetano, logo após o vídeo e transcrição do trecho do discurso do referido pastor.
Marco Feliciano:
“Alguns anos atrás, um cidadão sentado num banquinho, fazendo um show com uma viola cantou uma música cujo nome é “sozinho” e em uma semana e meia vendeu um milhão de cópias. O pessoal da mídia foi rastrear a música e descobriram que Tim Maia gravou a música e Sandra Sá também e ninguém canta melhor do que os dois… voz negra, parafernalha de instrumentos…só que nenhum dos dois vendeu mais que trinta mil cópias. Aí foram entrevistar o cantor baiano, e era Caetano Veloso e perguntaram:
Caetano, qual o seu segredo? Você bateu o Tim, você bateu a Sandra Sá, com um violão só… um milhão de cópias…
Ele disse: É simples, o meu segredo é Mãe Menininha do Patuá (termo usado pelo pastor)!
Como assim Caetano?
Antes de mandar qualquer música pra rádio, pro Brasil, eu levo pra ela e canto pra ela e ela possuída pelos Orixás diz assim: pode gravar que eu abençôo.
Você entendeu ou não? Não subestime o diabo!…”
e a resposta de Caetano Veloso:
Ainda Feliciano?
Sim, porque não há, dentre aqueles que prestam atenção no meu trabalho, quem não saiba que, ao cantar a genial canção de Peninha “Sozinho” num show, eu indefectivelmente dizia não apenas que me apaixonara por ela através das gravações de Sandra de Sá e de Tim Maia: eu afirmava que cantá-la ao violão era só um modo de chamar a atenção para aquelas gravações. Como pode Feliciano dizer que “a imprensa foi rastrear” e descobriu que a música já tinha sido gravada por Sandra e Tim? Essas duas gravações eram sucessos radiofônicos. E como pode ele, sem piedade daqueles que com tanta confiança o ouvem em seu templo, afirmar que eu disse em entrevista coisa que nunca disse e nunca diria, ou seja, que o êxito inesperado de minha versão de “Sozinho” se deveu a eu ter mostrado a faixa a Mãe Menininha e esta ter-lhe posto uma bênção que, para Feliciano, seria trabalho do diabo? Mãe Menininha, figura importante da história cultural brasileira, já tinha morrido fazia cerca de dez anos quando gravei a canção.
É muita loucura demais. E muita desonestidade. Aprendi com meu pai os gestos da honestidade — e tomei o ensinamento de modo radical. Me enoja ver a improbidade. Feliciano sabe que eu nunca dei tal entrevista. Mas não se peja de impressionar seus ouvintes gritando que eu o fiz. Ele, no entanto, não sabe que eu jamais sequer mostrei qualquer canção minha à famosa ialorixá. Nem a Nossa Senhora da Purificação eu peço sucesso na carreira. Nunca pedi. Nem a Deus, nem aos deuses, e muito menos ao diabo. Decepciono muitos amigos por não ser religioso. Mas respeito cada vez mais as religiões. Vejo mesmo no cristianismo algo fundamental do mundo moderno, algo inescapável, que é pano de fundo de nossas vidas. Mas não sou ligado a nenhuma instituição religiosa. Eu me dirigiria aqui àqueles que o são. Os homens crentes devem tomar atitude mais séria em relação a episódios como esse. O que menos desejo é ver o Brasil dividido por uma polaridade idiota, em que, de um lado, se unem os que querem avanços nos costumes, e de outro, os que necessitam fundamentos de fé, ambos gritando mais do que o conveniente, e alguns, como Feliciano, saindo dos limites do respeito humano. Eu preferiria dialogar com crentes honestos (ou ao menos lúcidos). Não aqueles que já se põem a uma distância segura da onda neopentecostal. Eu gostaria de dialogar com um Silas Malafaia, de quem tanto discordo, mas que respeita regras da retórica e da lógica. Marina Silva seria ideal, mas poupemo-la. Não é preocupante, eu perguntaria a alguém assim, que um dos seus minta de modo tão escancarado? É fácil provar que nunca fiz aquelas declarações e é fácil provar que Sandra e Tim tiveram êxito com a obra-prima de Peninha. E que eu louvei esse êxito ao cantar a canção. Foram dezenas de milhares de brasileiros que ouviram. Se Feliciano precisa, para afirmar sua postura religiosa, criar uma caricatura caluniosa dos baianos e da Bahia, algo é muito frágil em sua fé. A maré montante do evangelismo não dá direito à soberba irrefreada. O boneco tem pés de barro. E cairá. Eu creio na justiça e na verdade. Esses valores atribuídos a Deus têm minha adesão irrestrita. Não sei que Deus sustenta a injustiça e a mentira. Ou será que é aí que o diabo está?
fontes:
Vídeo do Youtube: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=Zla1R6gDCtE
Resposta de Caetano: http://www.caetanoveloso.com.br/blog_post.php?post_id=1397
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